A morte de Lampião e o pseudo-fim do cangaço no Nordeste

Virgulino Ferreira da Silva nasceu no município de Serra Talhada, em Pernambuco, e se dedicou a várias atividades: vaqueiro, poeta, ator, músico, operário, estrategista militar e chegou ao posto de capitão das forças públicas do Brasil, na época do combate à Coluna Prestes, no governo de Getúlio Vargas.

Sua infância, igual à de qualquer menino nascido no sertão nordestino; pouco estudo e muito trabalho desde novinho. Ainda menino, seu tio lhe dá um livro da biografia de Napoleão Bonaparte o que influenciou várias novidades desde o chapéu em meia lua, algo inédito até a entrada de Lampião no cangaço, até a formação de grupos armados e de táticas de guerrilha.

O jovem Virgulino conheceu todo o Nordeste, do Moxotó ao Cariri, vendendo de tudo pelas cidades, povoados, vilas, sítios e fazendas da região - bugigangas, tecidos, perfumes, artigos em couro; mercadorias do litoral para abastecer o sertão. Com 19 anos, ele trabalhou para Delmiro Gouveia e transportava algodão e couro de bode para a fábrica da Pedra.

Nas estradas péssimas do início de século XX, o transporte era o lombo do burro. Dessa forma Virgulino dominou os caminhos e trilhas do Nordeste, um fato decisivo para a sua sobrevivência, durante mais de vinte anos, no comando do cangaço.

O cangaço, como ocorrência social deixou marcas sensíveis na história das populações exploradas dos sertões nordestinos. Registros do século XIX demonstram a existência deste fenômeno durante quase dois séculos. O cangaço proliferou dado à subserviência do Estado, aos desmandos cometidos pelos coronéis e pela polícia e o desinteresse do poder público pela região.

O poder dos coronéis do sertão também reforçado por “jagunços” prevalecendo em detrimento dos direitos fundamentais da população. A economia sertaneja originária da criação de gado para o suprimento do país. As sesmarias do sertão historicamente foram povoadas em função da pecuária. A “carne do sertão” servia aos engenhos de açúcar e abastecia as cidades do Brasil.

O governo brasileiro não assegurava os direitos básicos, fundamentais aos sertanejos; educação, saúde, moradia, emprego daí a sobrevivência no sertão muito sofrida e complicada; o único ente estatal presente na região era a polícia, “a volante” sempre na defesa do “status-quo”, autoritária e intimidativa.

O sertão nordestino sempre recebeu tratamento desigual e a seca como sempre um meio de manter os privilégios da elite regional. Como fenômeno histórico o cangaço é um signo social da reação a tal modelo desumano de ocupação e altíssima concentração de renda e de influência política, muito mais acentuada no nordeste, do território brasileiro.

28 de Julho de 1938 – chegava ao fim a saga do líder cangaceiro mais polêmico e influente da história do cangaço. Explicar a morte de Lampião suscita controvérsias e estimula a imaginação, sobre o fim de seu "reinado" nos sertões nordestinos.

Entre a chacina de Angicos e a versão oficial que sustenta um tiroteio com as forças volantes de Alagoas ali guiadas pelo próprio coiteiro Pedro de Cândido, existe também a versão do envenenamento de grande parte do grupo que se encontrava acampado na Grota do Riacho de Angicos, em Sergipe.

Após 70 anos o sertão nordestino e sua realidade quase não mudaram; mesmo o cangaço extinto e ao invés de jagunços surgiram os “pistoleiros de aluguéis” do asfalto; e os coronéis d’antes, engalfinhados entre os três poderes, agora gozam foro privilegiado. A seca continua o flagelo de milhões de sertanejos, ainda tratados com os resquícios assistencialistas das oligarquias do passado. Finalmente, a mesma corrupção e impunidade; transmutados os personagens e a moeda.

Infelizmente, de muito antes do cangaço, é o Brasil.